O Filme da Minha Vida

Direção de Selton Mello. Com Johnny Massaro, Bruna Linzmeyer, Vicent Cassel, Selton Mello, Bia Arantes, Rolando Boldrin, Ondina Clais e João Prates.

Amor em meio a melancolia

Entre comédias escrachadas de gosto duvidoso estreladas por Leandro HassumPaulo Gustavo e cia. e filmes onde crimes e favelas são o centro das atenções, damos de cara com algumas produções de menor orçamento e sem tanto apelo midiático, porém, que trazem consigo valores grandiosos e uma ambição gigantesca quando se trata de entregar ao público brasileiro algo completamente diferente do que ele está acostumado a ver, falando pelo menos nos cinemas convencionais. É por conta dessa carência de conteúdo fora do comum, que inspiram e trabalham bem com vários aspectos da sétima arte que O Filme da Minha Vida surge como uma obra que, apesar de problemas pontuais, salta aos olhos. O terceiro longa-metragem de Selton Mello (antes vieram Feliz Natal, 2008 e O Palhaço, 2011) é um filme que requer atenção, paciência e não só precisa, como merece ser degustado. Narrado de maneira poética, preocupa-se em incomodar o ‘espectador’ com sua melancolia e nostalgia.

Baseado no livro Un Padre de Película, de Antônio Skármeta, a trama conta a história de Tony Terranova (Massaro), filho de pai francês e mãe brasileira e como ele mesmo diz no início do filme “dormir não é algo que ele faz muito bem”. Quando volta para casa após uma temporada de estudos na capital, o professor Tony tem de encarar a lacuna deixada pela partida sem explicações do Pai, Nicolas (Cassel), que segundo Paco (Mello), amigo da família, é um homem do mundo e que voltará quando quiser voltar. Personagens ricos em personalidade, alguns frustrados, outros sonhadores, mas todos repletos de vontades que vão além do trivial. Ainda que o foco esteja na relação pai/filho, nenhuma figura deixa de receber a devida atenção graças a direção observadora e precisa de Selton Mello, que entende a importância de todos os personagens e o drama no qual cada um está inserido. Em troca recebe de todo o elenco atuações eficientes, que correspondem rapidamente ao que são exigidos.

Em plena sinergia com o material humano, o realizador ganha o suporte de outros aspectos técnicos bem executados. Ambientado no Rio Grande do Sul, a narrativa traz uma fotografia coerente com a fictícia cidade de Remanso. O frio é sentido pelo design de figurino, mas aquele calorzinho do sol de inverno se torna crível devido a excelente fotografia exibida. O tom sépia e a paleta de cores saturadas são elementos importantíssimos para destacar a época do filme, no caso, os anos 50, e principais responsáveis em transmitir a melancólica e o clima de nostalgia para o espectador. Além do visual, a trilha sonora, com suas belas canções francesas e algumas populares brasileiras, faz questão de facilitar a entrada naquela na atmosfera bucólica. A montagem, outro artifício encarregado de mover a narrativa contribui de maneira mais tímida, em certos momentos prejudicando o desenvolvimento. As rimas visuais são sutilmente charmosas, em contrapartida os flashbacks cansam e ferem o ritmo.

Contando com um roteiro bem amarrado escrito por Selton Mello em parceria com Marcelo Vindicato, O Filme da Minha Vida usa da licença poética da qual se baseia para apresentar um argumento de diálogos reflexivos, muitos deles provocados por perguntas simples, mas com respostas complexas (“Por que  o senhor considera seu trabalho nobre?/ Porque é bom saber que estou levando as pessoas para fazer algo“, pergunta Tony ao maquinista que responde com um orgulho admirável.) Embora algumas conversas resultem até mesmo num inesperado momento de graça, a grande maioria delas são pausadas e aí entra a paciência a qual já fiz menção. Não há dinâmica entre os atores, apesar da química entre os mesmos. Todo diálogo parece durar uma eternidade em prol de um final filosófico. Somado a essa sofrência, a trama tem uma reviravolta digna de novelão, que apesar de manter a coesão da narrativa soa meio que exagerada. Um filme demasiado poético, as vezes árduo, mas que se faz necessário em meio a tantas besteiras que a gente vê por aí. É tudo uma questão de treinar nosso olhar para receber melhor o diferente.

NOTA: 7,5